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sábado, 18 de setembro de 2010

42 - A Vitória e a Judiaria do Olival

Pesquisar na net é como o provérbio das palavras e das cerejas. De sítio em sítio, fui dar à estória da Judiaria no Porto.
Mesmo antes do Condado Portucalense, já existiam Judeus na região, naturalmente, porque estavam espalhados pelo que é hoje a Península Ibérica. Ajudaram os "Mouros" na Conquista da Península, tendo-se depois aliado aos "Cristãos" para os expulsar. Séculos de boa história.
No Porto, vivam dentro ou próximo da Cerca Velha (primitiva muralha em Pena Ventosa, o Morro à volta da actual Sé) mas eram autorizados para utilizar as ruas que davam para o Rio (Douro, claro) onde tinham as suas oficinas e comércios. Séculos depois espalharam-se pela cidade e construíram a maior Judiaria em Miragaia. Onde estão as ruínas do Convento de Monchique seria o local da sua Sinagoga. E o cemitério Judeu não ficava longe. Mas é a Judiaria do Olival e a Vitória que quero dar a conhecer. Pelo menos um pouco, na medida em que sou um ignorante profundo de tudo que diz respeito ao tema. Mas adiante.

A actual Rua de S. Bento da Vitória, de quem entra pelos Clérigos.

Em finais do século XIV, D. João I decretou que os Judeus fossem viver para o Olival (local onde hoje se encontra o Jardim da Cordoaria, Clérigos e por aí fora), mas dentro das Muralhas. As Fernandinas. Que não terá sido do seu agrado. Entretanto foram recebidas famílias oriundas de Espanha, expulsas pelo rei não sei quantos e aqui alojadas. O seu espaço terá sido compreendido entre o que é hoje a Rua de S. Bento da Vitória, Rua de S. Miguel, Rua das Taipas até Belmonte. Sempre por dentro das Muralhas.

Há quem escreva que no local onde se encontra a Igreja e Convento de S. Bento foi onde existiu a Sinagoga do Olival. Terá sido encontrada um pedra com escritos Hebraicos lendo-se, mais ou menos, pois transcrevo de cor, Antes de existir a Igreja de Deus dos Monges Negros existiu a Igreja de Israel.
Quando o Rei D. Manuel assinou a ordem da expulsão dos Judeus, em finais do séc. XV,o povo do Porto não a aceitou. Não denunciou os que se esconderam e acolheu os que passaram a ser os Cristãos Novos. Na parede do Convento de S. Bento, está colocada uma placa em Memória dos Judeus expulsos ou que foram obrigados a reconverterem-se.
As actuais ruas de S. Bento da Vitória e S. Miguel (foto) era uma única e chamava-se Rua da Judiaria Nova. Após o decreto da expulsão dos Judeus, passaram a viver aqui juntamente não só a população que quis, talvez até para confundir os decretores de leis, como magistrados e funcionários do Tribunal da Relação. Que estava ali a dois passos.
No prédio nº 9, adquirido há meia dúzia de anos pela paróquia da Vitória para albergar um Lar de Idosos, durante a sua restauração foi encontrada uma parede falsa e nela um nicho ( ekhal, a reentrância onde eram guardados os rolos da Torá, a parte mais sagrada da sinagoga, também conhecida simplesmente como Arca). O arqueólogo Mário Jorge Barroca concluiu que a casa foi uma Sinagoga clandestina, no séc. XVI/XVII. A sua descoberta nesta localização, segundo afirma a historiadora Elvira Mea, enquadra-se nos relatos do rabino Immanuel Aboab – que nasceu e foi criado no Porto – inscritos no seu livro Nomologia o Discursos Legales, publicado em Amsterdão em 1629. (http://ruadajudiaria.com/)
Início da Rua de S. Miguel. À esquerda o prédio nº4 com a frontaria coberta de azulejos do séc. XVII que saíram do Convento de S. Bento. À direita a casa que albergou a Sinagoga Clandestina. Em frente, a Igreja de Nossa Senhora da Maria da Vitória, onde, segundo outros historiadores, poderá ter existido a principal Sinagoga do Olival.
A Rua de S. Bento da Vitória, vista no sentido S/N, do largo encostado à Igreja de Nossa Senhora. Um miradouro por excelência, totalmente degradado.
No largo, dois prédios em ruínas e a sujidade (embora menos que há uns 4 meses atrás) devem ser a razão porque o espaço não é mencionado nos roteiros turísticos. Para não termos vergonha do que possam pensar. Adiante. Aqui existia uma tipografia e encadernação. No dia 14 de Maio passado, ainda ouvia as máquinas a trabalhar e o cheiro das tintas. Hoje (17 de Setembro) já não as ouvi.
Neste outro prédio, reparo no pormenor da arquitectura. Mas leigo como sou destas coisas, passo em frente e sigo a rota da Judiaria do Olival.
De cima do chamado antigamente Morro do Olival, o olhar abrange o velho casario do Porto Histórico. Em frente Gaia e o Douro, mas isso fica para outros escritos.
Em baixo, encontramos a Rua da Vitória - antiga S. Roque ou Viela da Esnoga - que une as Ruas dos Caldeireiros às Taipas, logo ali nas Virtudes, já na freguesia de Miragaia.
Para lá chegarmos, precisamos de calcorrear uma vintena de metros pela Bataria da Vitória, toponímico homenageando a bataria (artilheira, pois claro) que aqui esteve colocada aquando das Lutas Liberais. Salvé D. Pedro IV. O Primeiro do Brasil, o do Grito do Ipiranga. O do coração cá (no Porto, pois onde havia de ser) e do corpo (os restos mortais) lá. No Brasil. Adiante.
Umas escadas, cujo nome desconheço, que nos levam até meio das Escadas da Vitória, antiga Escadas da Esnoga. Nem sei se fazem parte do mesmo toponímico. Vão dar a Belmonte, (já é parte da freguesia de S. Nicolau) onde a Judiaria tinha um ramo importante.
Nem imagino o que é vir de Belmonte, subindo esta escadaria.
Li, num dos vários artigos sobre a Sinagoga Clandestina, que haveria uma entrada também ela clandestina, por uma das casas da Rua da Vitória. Vamos olhando e medindo as alturas.
Um pormenor das Escadas da Vitória, antiga Escadas da Esnoga.
As Escadas entroncando na Rua da Vitória.
Visto desde a Rua da Vitória, o tal prédio de arquitectura curiosa (para mim) cuja fachada está no largo junto à Igreja de Nossa Senhora. Lá em cima. Lembram-se ?
Só mesmo passando no local se pode ter uma ideia da construção destes muros e destas casas.
Pormenor de uma fachada sobressaindo de entre os muros. Não é muito visível. Está localizada a meio da Rua, sensìvelmente entre as Escadas e as Taipas.
Depois da descoberta da Sinagoga Clandestina e do esforço da Historiadora Elvira Mea para que a Câmara do Porto, IPAR, Governo Civil e uns tantos outros organismos, conseguissem desbravar mais sobre esta descoberta e apenas o Pároco esteve pronto a colaborar, não sei como tudo ficou. Já lá vão 5 anos e nada mais li sobre o assunto.

Não sei qual a língua da palavra Esnoga. Até pode ser em português antigo. Sei que quer dizer Sinagoga pois está escrito pela Câmara.

A freguesia da Vitória, nesta zona do chamado antigo Olival é muito rica não só em história como monumental. Aliás, toda ela é rica. Mas infelizmente os cardápios turísticos só referenciam a Torre dos Clérigos. São achas para uma fogueira quando vierem dias mais frios.

Parece não haver grandes escritos legados pelos judeus que nos podessem a dar a conhecer mais história. Nem sequer plantas das suas Sinagogas. Ninguém faz ideia de como eram.

Para quem gostar de saber alguma coisa sobre alguma História do Judaísmo em Portugal recomendo este site:

http://repositorio-aberto.up.pt/.../gcdiaspresencajudeus1000082238.pdf