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quinta-feira, 29 de março de 2012

123 - Rua dos Mártires da Liberdade

Em 7 de Maio de 1829, doze homens Liberais fieis a D. Pedro IV, foram enforcados e decapitados por ordem do tribunal Miguelista, na Praça Nova, actual Praça da Liberdade. Os frades do Convento de S. Francisco Nery ( Onde hoje está uma das dependências da Caixa Geral de Depósitos e que já foi o Banco Nacional Ultramarino, adoçado à Igreja dos Congregados) vendo o espectáculo das suas celas  festejaram-no com Vinho do Porto e Pão de Ló, brindando a D. Miguel e à santa religião... (Texto respigado de um escrito de Germano Silva no Jornal de Notícias de 8 de Maio de 2000)
A Cidade do Porto homenageou estes Mártires, não só guardando os restos mortais num Mausoléu no Cemitério do Prado Repouso mas também em duas toponímias. Uma delas é a Rua dos Mártires da Liberdade.
Que começa no entroncamento da Rua da Conceição e Travessa de Cedofeita e no final da Rua das Oliveiras. Vinda da Praça de Carlos Alberto, iniciava-se aqui a Estrada de Braga, que continuava pela Lapa (Lugar de Germalde), Paranhos (Lugar do Sério) e Amial até aos limites da Cidade, encostada aos terrenos e Palácio dos Viscondes de Balsemão - que já foi dos Serviços de Águas e Saneamentos do Porto (lembra-se a malta do Porto quando os nossos "velhos" diziam que iam pagar a água a Carlos Alberto ?) e também Hospedaria, a do Peixe, e onde viveu algum tempo, pouco, o Rei Carlos Alberto da Sardenha, aquando do seu exílio em Portugal.
Vamos seguir a Rua desde aqui até à Praça da República, onde termina a pouco mais de 300 metros de distância.

Antes da toponímia actual foi no séc. XVII a Estrada de Santo Ovídio, depois Rua Direita de Santo Ovídio, retiraram-lhe a Direita e em 28 de Maio de 1835 a Câmara mudou o nome para 16 de Maio, em homenagem aos Liberais que neste dia em 1828 tentaram restaurar a Carta Liberal. Só em 1860 tomou o nome porque é conhecida. Mas há um pormenor de que me lembro bem. A minha avó só lhe chamava a Rua da Sovela. E não há erro porque a Junta de Freguesia de Santo Ildefonso a refere em 1822. http://www.jf-stildefonso.pt/
  
Logo à entrada de quem vem de Carlos Alberto, à direita, encontramos a lendária Livraria Académica, fundada em 1912 na Rua das Oliveiras e para aqui transferida em 1913, por Joaquim Guedes da Silva. Teve no Sr. Nuno Canavez, seu ex-empregado desde muito jovem, um continuador de mérito. É ponto de encontro da intelectualidade portuense e não só.
Especialmente dedicado aos maluquinhos dos livros e a quem interessar, tomem nota deste link: http://www.livraria-academica.com/


Foto de autor que desconheço
Natural de Mirandela, com uma obra de grande mérito publicada sobre Trás-os-Montes aliada aos grandes catálogos que publica, (presumo ser o único Livreiro-Alfarrabista que o faz, em Portugal), foi Nuno Canavez reconhecido por Mário Soares, creio que posteriormente por Jorge Sampaio também, como Presidentes da República, ao conferirem-lhe comendas honoríficas. Este bem as merece.
Por falar em Trás-os-Montes e Mirandela, permitam-me uma história de vida. Nos tempos em que "desbravava" aquelas terras em trabalho, nos anos 80 do século passado, a Biblioteca Municipal (cujo patrono é o velho General Sarmento Pimentel) tinha sido inaugurada há poucos anos. Passava por lá, conversava com um "rapaz" novo, acabado de licenciar-se - cujo nome esqueci - e que presumo ter sido o Director na altura. Falava-me dos muitos projectos da Cidade, precisava da minha colaboração, mas não havia dinheiro. Aguardava melhores dias. Eu adorava a minha viagem transmontana que normalmente constava do itinerário Chaves, Valpaços, Bragança, Macedo, Mirandela, Régua. Uma vez ou outra também Miranda do Douro, Moncorvo, Vale do Tua. "Batia" tudo que eram Câmaras Municipais, Cooperativas de Produção, Hotéis. Também nessa altura pouco mais havia com quem negociar dentro do meu campo profissional. Muitas recordações de comesainas que me eram oferecidas, grandes amigos por lá fiz e também alguns negócios. 
Já não lembro o ano, mas foi logo na primeira segunda-feira de Janeiro, abalei bem cedo do Porto para Trás-os-Montes. Falava a meteorologia de um temporal que por ali deveria passar. De terra em terra, fui andando à frente dele. Aquela gente chamava-me maluco. Até que em Mirandela, ao meio da tarde, depois de breve troca de cumprimentos com o Doutor antes referido, abalei a caminho de Murça tentando fugir ao temporal. Logo no princípio das famosas curvas fui apanhado por um nevão. Tentei romper, mas numa das curvas para a esquerda, o carro fugiu todo para a berma. Era sempre a descer morro abaixo desse lado. Por sorte ou lá o que fosse, o carro embicou para a direita e bateu num muro, imobilisando-se. Novamente a sorte bateu à porta e um camião que descia a serra, rebocou o velho Golf de regresso a Mirandela. Onde um "endireita" esticou o guarda-lamas e lá regressei ao Porto no dia seguinte. Gente boa, que nem me quis dinheiro pelo trabalho. Por essas e por muitas outras, nunca esquecerei os Transmontanos. 
Essa Biblioteca, tem hoje mais de 30.000 volumes e uma grande contribuição do Senhor Nuno Canavez.   

No largo que aqui se forma, homenageando o grande Alberto Pimentel, cuja história ficará para outra altura, encontramos a Fonte das Oliveiras, assim chamada por primitivamente ter estado naqueles terrenos e construída em 1718. Foi remontada para este local em 1823 e ficou adoçada a um edifício da mesma época, com a fachada recoberta a azulejos. É uma obra barroca muito simples, cujo elemento decorativo é uma concha que envolve um golfinho. Foi restaurada em meados do séc. XX

Encontramos velhos prédios, alguns em bom estado de conservação, outros nem tanto. Nesta rua funcionavam pequenas oficinas de carpintaria, serralharia e também adelos, alfarrabistas, comércios de mobiliário. E umas tasquinhas onde imperavam, além dos "négos" (copo pequeno para servir vinho, muito comum na Cidade do Porto da altura) brancos ou tintos, sempre uns petiscos para acompanhar. É assim que me recordo da rua, pois por ela andei imensas vezes na minha pós-meninice e juventude.

À esquerda encontramos a Rua de S. Carlos, que vai dar ao antigo Largo do Mirante, agora Praça Coronel Pacheco. Outras histórias.

Quási em frente o edifício onde foi instalada em 1912 a Renascença Portuguesa saída da Implantação da República em 1910. Um movimento nacional, com sede no Porto e núcleos em Coimbra e Lisboa, tendo como mentores Jaime Cortesão, Teixeira de Pascoaes, Leonardo Coimbra e Álvaro Pinto.
Manteve como seu órgão principal A Águia, propriedade do grupo entre 1912 e 1932, ano em que a sua publicação cessou. A esta publicação juntou-se, durante alguns anos, o quinzenário A Vida Portuguesa e uma intensa actividade editorial que, em 1918 contava já com 120 volumes publicados, cobrindo temas de literatura, arte, ciência, filosofia e crítica social. Entre os autores editados contam-se Carlos Parreira, o Visconde de Vila-Moura, Teixeira de Pascoaes, Mário Beirão, António Sérgio, Ezequiel de Campos. A partir de 1928 a revista Portucale prosseguiu o espírito de A Águia.

No periódico A Águia, transformado no órgão central do movimento, colaboraram, para além dos fundadores, Mário Beirão, António Correia de Oliveira, Afonso Lopes Vieira, Fernando Pessoa e Mário de Sá Carneiro, tendo estes dois saído para fundar o movimento Orpheu. Outros se seguiram para fundar a Seara Nova.
Textos pesquisados em http://purl.pt/12152

Edifícios que outrora seriam belos, agora mal conservados


Uma bonita fachada em madeira, de uma loja antiga agora transformado em Bar.

Pormenor de uma linda fachada

Logo a seguir à esquina da Rua dos Bragas, em homenagem aos antigos donos dos terrenos, fica a casa onde nasceu o Doutor Ricardo Jorge.

Médico, Professor Universitário e Escritor, Ricardo Jorge (1858/1939) frequentou com brilhantismo a Escola Médico-Cirúrgica do Porto de 1874 a 1879, tendo concluído, aos 21 anos de idade, a licenciatura em Medicina com a "dissertação inaugural" Um Ensaio sobre o Nervosismo. Após umas viagens de estudo ao estrangeiro, regressou a Portugal e deu início a um curso de Anatomia dos Centros Nervosos e criou o pioneiro laboratório de microscopia e fisiologia do Porto. Dedicou-se à Saúde Pública e também à Hidroterapia, tendo publicado vários estudos e especialmente sobre as Caldas do Gerês.
A convite da Câmara Municipal do Porto, em 1892, com quem já tinha colaborado sobre questões de Higiene Pública, dirigiu os Serviços Municipais de Saúde e Higiene da Cidade do Porto e chefiou o Laboratório Municipal de Bacteriologia. No âmbito destas actividades publicou a série do respectivo Anuário e um Boletim Mensal de Estatística Sanitária do Porto, que fizeram dele o introdutor da moderna estatística demográfica em Portugal.
Abandonou a Cidade do Porto em 1899, aquando da Peste Bubónica, descontente com a população, violenta e instigada por forças políticas contra a sua orientação pelas medidas profiláticas que tentou implementar.
Em Lisboa desenvolveu intensa actividade criando organismos de estudo, presidindo a instituições e representando Portugal em conferencias no estrangeiro. Fundou o que hoje se chama o Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge.
Estudou figuras célebres, nacionais e estrangeiras, foi amigo de Camilo Castelo Branco e diz-se ter sido o responsável nos anos 20 da proibição da Coca-Cola em Portugal  que só 50 anos depois foi levantada, tendo alegadamente ordenado a sua apreensão e destruição depois de tomar conhecimento do slogan publicitário da bebida criado por Fernando Pessoa "Primeiro estranha-se, depois entranha-se". A história foi contada por Luís Pedro Moutinho de Almeida, filho do então representante da Coca-Cola em Portugal, no JL - Jornal de Letras, Artes e Ideias (Lisboa, 16 de Março de 1982).
Textos recolhidos na Wikipédia, numa das suas Biografias publicadas e em
Quási no final da Rua, encontra-se a sede da então denominada Associação dos Albergues Nocturnos do Porto, instituição criada por iniciativa do Rei D. Luíz I em 1881.
Desde então é uma porta aberta, todos os dias do ano, ao serviço dos sem-abrigo, daqueles que por uma razão ou por outra se aninharam na faixa da marginalidade e dormem embrulhados na solidão.
É um espaço físico polivalente onde se procura despertar nos utentes o interesse pelo trabalho, desenvolvendo a sua criatividade ou apenas as suas técnicas manuais ou corporais.
Mais do que isso procura-se através de várias actividades como a pintura, a escultura, a escrita, a leitura, a dança ou a música, fazer ressurgir atitudes, valores e capacidades laborais que levem a uma futura e consistente integração na sociedade, na família e no meio profissional.
Os Albergues possuem outras instalações em Campanhã, na Rua de Miraflor.
Aqui em Mártires da Liberdade funciona um loja onde vendem a baixos preços artigos ofertados. Mas necessitam de outras dádivas, especialmente artigos de higiene e alguns bens alimentares, especialmente conservas.
Ver o site http://www.alberguesporto.com/

E chegamos à Praça da República e ao Jardim de João Chagas sobre o qual já escrevinhei umas notas anteriormente...
É o lugar de Germalde, ou da Lapa como hoje é conhecido. Permitam-me os meus amigos, visitantes e leitores, recordar-lhes que comecei pelo meio da famosa Estrada de Braga (Paranhos e Amial, Antero de Quental e Monte de Germalde) e  agora no seu quási princípio. Pois falta-me do Amial até à Circunvalação, o seu términus. E a Rua das Oliveirinhas e Praça de Carlos Alberto, o seu começo. Talvez fiquem para Histórias (ou Estórias, como diria o saudoso Carlos Pinhão ?) futuras, embora a Praça de Carlos Alberto já tenha sido referida por mim muitas vezes. 

sexta-feira, 23 de março de 2012

122 - A Rua de Cedofeita

É uma Rua cheia de história a que recordo hoje. Situada no coração da Freguesia de Cedofeita, cujo nome deriva, segundo a lenda, da rapidez ( cito facta )  com que foi construída a velha Igreja dedicada a São Martinho, edificada primitivamente durante o domínio Suevo no séc. VI. Mas essas ficam para outra altura bem como a da história do Templo.
Historiadores dizem  que o Couto de Cedofeita existe doado por D. Afonso Henriques, o nosso primeiro Rei – séc. XII – e outros desmentem. Não sei quem são ou foram uns e outros nem a quem foi doado, mas a ser verdade deve ter sido ao Bispo do Porto.
Vamos conhecer a Rua, seguindo no sentido Carlos Aberto/Boavista.

Ora esta Rua de Cedofeita que hoje começa na Praça de Carlos Alberto, (antiga Praça dos Ferradores) era conhecida em 1777 como a Rua da Estrada, que ligava o Porto à Povoa - ver minha postagem 111 -, mas na realidade começava antes, na Cordoaria, junto às Muralhas Fernandinas e à Porta do Olival (?).
Começou a ser pensada a sua abertura em 1762, por iniciativa de João de Almada e Melo aquando no cargo, que presumo corresponder nos dias de hoje a ministro, de Presidente da Junta das Obras Públicas do governo do Marquês de Pombal, a quem ligavam laços Familiares. Foi um dos grandes obreiros da modernização de Lisboa depois do Terramoto de 1755.
Veio para o Porto onde começou obras de grande vulto. Uma delas ligar a zona portuária do Douro com as partes altas da Cidade. A Rua de Cedofeita foi uma das vias que idealizou.
Uma pequena nota sobre este Almada. Não foi só político, mas também militar e grande amante das artes. Talvez tenha sido o introdutor do teatro lírico em Portugal. Para os interessados, recomendo a leitura da sua biografia em  http://sigarra.up.pt/up/web_base.gera_pagina?P_pagina=1006464

O certo é que a Rua foi aberta ràpidamente - volta aqui a entrar e com razão o cito-facta, traduzido para cedo-feita - e passou a conhecer-se como Rua Direita de Cedofeita.
A chamada Planta Redonda de Balck publicada em Londres (1813) mostra já o troço de Cedofeita até à Rua da Boavista, quase todo ladeado de casario. E como não podia deixar de ser refiro-me à Toponímia Portuense de Andrea da Cunha e Freitas.

A uma dezena de metros do início, olhamos para Oeste. É mesmo quási toda direita.

Olhando para trás, o pormenor da calçada e ao fundo a Torre dos Clérigos 

É uma artéria de grande aglomerado residencial, tendo no rés-do-chão da maioria dos edifícios comércios das mais variadas espécies. Quási todos eles - edifícios - são do séc. XVIII e princípios do séc. XIX,
predominantemente estreitos e compridos onde sobressaem as varandas de sacada com a arte do ferro tão tradicional do Porto, cantarias nas pilastras e cimalhas de granito e azulejos na fachada, estes já do séc. XIX ou XX.
Vamos mostrar em pormenor alguns desses edifícios, contar a sua história bem como de alguns dos seus primitivos donos e/ou ocupantes. A maior parte deles são referenciados como imóvel de interesse púbico pelo IGESPAR. Para os interessados mais um site http://www.igespar.pt/pt/patrimonio/pesquisa/geral/

O nº 124-128 teve a característica da montra recuada (Texdekor). Aproveitaram as colunas para avançaram com a frente da montra.

Os nºs 154 e 162 são os mais antigos da Rua.

 Vistos de frente

No nº 159 viveu a grande Carolina Michaelis e seu marido Joaquim Vasconcelos, casados em 1876. Ela
é reconhecida como a mais importante das filólogas da língua portuguesa. Foi crítica literária, escritora, lexicógrafa, tendo sido a primeira mulher a leccionar numa universidade portuguesa, a de Coimbra. Teve igualmente grande importância como mediadora entre a cultura portuguesa e a cultura alemã. Nasceu em Berlim em 15 de Março de 1851 e Morreu no Porto em 22 de Outubro de 1925. Uma biografia a não perder em http://cvc.instituto-camoes.pt/hlp/biografias/cmvasconcelos.html
Joaquim Vasconcelos natural do Porto e onde faleceu (1849-1936) musicólogo e historiador de arte, vivia e estudava na Alemanha quando conheceu Carolina. Foi um dos grandes pioneiros da divulgação e desenvolvimento da arte popular. As exposições no Porto em 1881 de Industrias  Caseiras e um ano mais tarde da exposição de Cerâmica devem-se em grande parte a ele. Crítico entre os métodos de ensino inglês e o rigor alemão científico adaptados à arte portuguesa criou alguns anti-corpos. Deixou uma obra de grande valor cultural. José Augusto França disse que foi ele o real fundador da História da Arte em Portugal, entendida como ciência, com objecto e método próprios.
Parte de uma vida que vale a pena ler em http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/5555.pdf
Consta-se que na véspera da Revolução de 31 de Janeiro de 1891 (a primeira tentativa da implantação do regime republicano em Portugal), Antero de Quental, vindo de Vila do Conde, hospedou-se aqui e os estudantes da Academia Portuense organizaram na rua, em frente à casa, um grande comício patriótico. Antero falou aos estudantes da varanda da casa de Joaquim de Vasconcelos.

Este edifício não é dos referenciados pelo Igespar. Presumo ter sido uma escola primária, com o nome de Irene (Lisboa?). As poucas letras que ainda se lêm não permitem mais. No entanto há em Cedofeita uma Escola Irene Lisboa. Só uma pequena nota sobre: Irene do Céu Vieira Lisboa (Casal da Murzinheira, Arruda dos Vinhos, 25 de Dezembro de 1892 – Lisboa, 25 de Novembro de 1958), foi  escritora, professora e pedagoga. Estudou na Suíça, França e Bélgica onde se especializou em Ciências de Educação, o que a habilitou a escrever várias obras sobre assuntos pedagógicos. Durante a estadia em Genebra, mercê de uma bolsa do Instituto de Alta Cultura, teve a oportunidade de conhecer Jean Piaget e Édouard Claparède, com quem estudou no Instituto Jean-Jacques Rousseau. Afastada de exercer qualquer cargo pelo Ministério da Educação no tempo do Estado Novo pela sua tentativa de remodelação do ensino primário.

A seguir encontramos a Rua da Torrinha e quási em frente a Rua dos Bragas. Eram terrenos de José Ribeiro Braga. Voltados para Torre dos Clérigos, fica uma à direita e a outra à esquerda.
As duas Ruas. Por aqui corria muita água...
... Uma vistoria, a requerimento de José Braga... noutras e suas propriedades de Cedofeita e situadas na Rua da Torrinha, para ai se edificar um chafariz .... Assim oferecia o citado munícipe o terreno necessário a construção da fonte, mas impondo como condição a cedência por parte da câmara de pena e meia de água diários, (945 litros). Respigado na História da Fonte
Em frente à Rua da Torrinha e na Rua de Cedofeita, um pouco ao lado da muito antiga Casa Granado, construiu-se a Fonte de Cedofeita, que parece ter sido em 1826 mas não tenho certeza.
O que resta da Fonte está nos jardins dos SMAS (a que chamamos as Águas) em Barão de Nova Sintra. Um autêntico Museu de Fontes e Chafarizes dentro de um parque florestal magnífico. Recomendo uma visita.
A Rua dos Bragas é uma homenagem ao José Braga.

Vamos passar ao nº 395, frente e traseiras na foto, de um edifício com muita história. Durante o Cerco do Porto nas Lutas Liberais ou Guerra Civil, D. Pedro IV - o 1º Imperador do Brasil - acolheu-se a esta casa depois de ter sido bombardeado pela artilharia das tropas de D. Miguel situadas em Gaia, o Palácio das Carrancas (hoje Museu Nacional Soares dos Reis), onde tinha os aposentos.
Pertencia na altura a casa a Joaquim Ribeiro Faria de Guimarães (1807-1879), importante industrial da Cidade. Em 1857 fundou a Fábrica de Lanifícios de Lordelo do Ouro e foi proprietário de uma tipografia onde se imprimiam vários periódicos.
Geriu a Fundição do Bolhão, fundada pelo seu pai, desempenhou cargos de presidência em várias instituições oficiais e parlamentares. Foi vice-presidente da Câmara Municipal do Porto e, entre 1852 e 1854 foi o primeiro presidente da Associação Industrial Portuense hoje incluída na Associação Empresarial de Portugal. (acho que estou certo nesta afirmação).
Julgo que a Rua de Faria de Guimarães tem o topónimo em sua homenagem. Mas nada me diz se é verdade. Nem a própria Câmara Municipal esclarece nas Toponímias da Cidade.
Mais tarde foi adquirido por D. Júlia de Mello Sampaio de Lencastre, tendo servido de sede aos Tribunais Correccionais e ainda a uma Repartição das Finanças. Esta senhora presumo ter sido a 3ª baronesa de Pombeiro de Riba Vizela, mas o Lancastre e não Lencastre virá de seu marido D. Caetano Henriques Pereira de Faria de Saldanha e Lancastre. Sampaio também se deveria escrever Sampayo. Minudências.
Não sei como o edifício terá passado para Alfredo Leite da Silva, o senhor Citroen no Porto e após a sua morte para Augusto António Marques Tomé, o actual proprietário. Que o recuperou, talvez ainda não no seu todo, da degradação em que se encontrava. 

Paredes meias encontramos - sem referência do Igespar - a Casa da Família (?) Pinto da Costa. Como o nosso Papa Jorge Nuno, Presidente do Futebol Clube do Porto nasceu em Cedofeita, talvez o tenha sido neste casarão. São suposições minhas pois a casa só me foi mencionada por moradores da Rua. Não a conhecia nem a net me diz nada sobre ela.
Pormenor do Jardim visto através do portão e parte visível de um pormenor das traseiras.
Como se pode ver a casa está meio arruinada. O que é pena. Parece que teria uns jardins
magníficos e enormes. 

Vem a seguir a Casa dos Barões do Seixo, título criado por D. Maria II em 19 de Julho de 1845. Hoje é um condomínio fechado. Impressionante a altura de uma árvore quási encostada à casa, cuja espécie desconheço. Os jardins (consegui um pequeno pormenor visto da rua) foram criados pelo célebre paisagista Èmile David (Berlim, 1839-Porto, 1873), que entre outros projectou os Jardins do Palácio de Cristal, do Passeio Alegre e da Cordoaria. Este, infelizmente, após os temporais que o descaracterizaram, continua a ser alvo de más projecções. Coisas à Moda do Porto. Até a célebre Árvore da Forca, que nunca enforcou ninguém e resistiu séculos, lhe cortaram o pé. Mas continuemos por Cedofeita que é o que nos interessa agora.
Falta referir o edifício da Esquadra de Cedofeita, o último deste correr de grandes e belos prédios. Mas sobre este não há nada a dizer. Só sei que é arrendado, mas referencias nenhumas.
Mas nem tudo se perde, quando ouvimos uma história, registada em auto, garantiram-me. Foi em Cedofeita que se deu a primeira participação, da Cidade, sobre o roubo de um porco. E mai'nada.
   
Sobre o prédio nº 548 tinha a referência de existirem belos interiores do séc. XIX. Pertence actualmente à Congregação das Servas Franciscanas Reparadoras e acolhe um Lar Feminino. Foi-me permitida a entrada, gentileza sempre de enaltecer e agradecer e a autorização para fotografar o vitral e o tecto da entrada.
Todo o interior foi restaurado a expensas suas há dois anos. Infelizmente, um infiltração de água, destruiu parte do tecto.

O edifício seguinte pela ordem do caminhar é o nº 556, referido pelos seus azulejos. Não consegui obter mais informações.
No edifício que faz esquina com Álvares Cabral - sem qualquer referência do Igespar - nasceu Augusto de Castro Sampaio Corte-Real (Porto, 11 de Janeiro de 1883 - Estoril, 24 de Julho de 1971), mais conhecido por Augusto de Castro. Foi advogado, jornalista, diplomata e político com uma carreira que se iniciou nos anos finais da Monarquia Constitucional Portuguesa e se estendeu até ao Estado Novo. Ganhou grande notoriedade como comissário da Exposição do Mundo Português em 1940. Foi director do Diário de Notícias por dois períodos distintos, de 1919 a 1924, altura em que partiu em missão diplomática para Londres, e de 1939 até 1941.

Membro da Academia Brasileira de Letras, eleito em 25 de Janeiro de 1945, ocupando a cadeira nº 5, que pertencera a Eugénio de Castro (1869-1944).

Atravessando a Rua de Álvares Cabral (que vai dar, pela esquerda, ao antiquíssimo Templo referido no princípio deste escrito e talvez onde tenha começado a história de Cedo-Feita - cito-facta - ) na bifurcação com a Travessa da Figueiroa, a cerca de 50 metros acaba a rua que deu origem a estas histórias.
Nesse espaço existiu outra fonte que ainda se pode apreciar nos Jardins dos SMAS, antes referidos.
O seu nome, Fonte do Ribeirinho ou dos Ablativos, deve-se a dois factos:
Fonte do Ribeirinho, porque perto de onde estava colocada, ao lado norte passava um ribeiro que se formava de várias nascentes que se localizavam no Montes Pedral, do Cativo e da Lapa. Esse ribeiro tinha o seguinte percurso: Passava em Salgueiros, atravessava a Quinta Do Melo ou Águas-Férreas (Dos Viscondes de Veiroa), a rua de Cedofeita e a Ponte de Vilar, desaguando no Douro, na Praia de Massarelos.
Fonte dos Ablativos, devido a inscrição nela existente ser composta por vinte e quatro Ablativos. São vários os autores que transcrevem essa inscrição, assim como o seu significado .No entanto a que se transcreve é da autoria de Horácio Marçal no artigo O antigo sitio do Laranjal - in - O Tripeiro, Março de 1966, VI série, ano VI- ... a inscrição, lhe parece, ter algumas palavras que não são latinas e, em sua opinião, não é fácil de traduzir. Contudo, dá-nos a tradução da dita inscrição que é a seguinte: - Com aprazimento muitos e desagrado de outros, foram reunidas as águas que corriam sujas e desaproveitadas, pelas lajes da rua, e pelas margens do ribeiro, formando charcos imundos, e dificultando a passagem de transeuntes. Assim as águas conduzidas para esta fonte, tornavam o sítio, ate então incomodo e sujo, em belo e comodíssimo; e as águas agora limpíssimas, desalteraram os suburbanos sequiosos.
De destacar o medalhão, delicadamente trabalhado e envolvido por um cordão vegetalista, podendo observar-se a imagem de N. Sra. de Vandoma - Padroeira da Cidade - representada como é natural, entre duas torres.
Foi feita esta obra no reinado da piedosa, feliz e Augusta Rainha D. Maria I, por diligências de José Ribeiro Vidal da Gama, dos Conselhos de sua Real Majestade, Chanceler Portuense, servindo de Presidente do Tribunal de Justiça, no ano de 1790.
Respiguei textos e coloquei originais descritos na História da Fonte dos autores Américo Costa, Horácio Marçal e Hélder Pacheco.

As Cidades cresceram na História das gentes que habitaram - e habitam - nas suas Ruas. Espero tenham gostado da Rua de Cedofeita e das muitas Histórias que acolheu.

segunda-feira, 19 de março de 2012

121 - A Capela do Senhor d'Além, Vila Nova de Gaia

Escreveu-me uma estudante de arquitectura sobre uma visita que fez e partilhou à Capela do Senhor d'Além, ofertando umas fotos dum sítio que deveria estar preservado. Até porque agora passa bem próximo a nova via pedonal que vem desde a saída da Ponte Luíz I (Rua do Cabo Simão) até ao Areiinho.

Esta uma imagem com quási três anos que fiz quando ainda não existia a tal via.

Mas leia-se o que me escreveu a amiga:

Foi com interesse que li no seu blogue sobre a referida capela. Sou estudante de arquitectura e no ano passado foi-nos dado um trabalho de projecto a realizar em toda a área da escarpa da Serra do Pilar. Inicialmente é feita uma pesquisa da área e um levantamento de todas as tipologias e edifícios de interesse arquitectónico e patrimonial e assim, tanto a capela do Senhor d’Além e o antigo convento carmelita foram assuntos bem discutidos nas aulas, de como estes “pedaços vivos de história” são deixados ao abandono quando na realidade deveriam ser revitalizados e integrados em circuitos turísticos e culturais, sendo sempre uma mais valia para a identidade e história da própria cidade...enfim, o resultado de anos de indiferença está á vista.
Procurei informação na net e em livros dias a fio, mas as fontes eram sempre semelhantes e pouco ou nada acrescentavam. Tinha imensa curiosidade em ver a tão falada talha dourada, os acessos á torre sineira, as dependências complementares e o real estado de abandono em que a capela se encontrava. Procurei fotos do seu interior e não encontrei nada para grande desconsolo meu. Passei por lá várias vezes e espreitava sempre á fechadura, era mais forte que eu.
Até que um dia, enchi-me de coragem com um colega de faculdade e saltamos por uma porta lateral, percorremos pela traseira da igreja até encontramos uma janela aberta.
Era estreita e alta, comunicava para uma sala que era de apoio á sacristia. Por cima desta sala, em péssimo estado, estava um piso de habitação com cozinha e dormitório, tudo velho e a abandonado, claro, devia ser onde pernoitava o sacristão ou sacerdote.
Esta era a tal dependência anexa ao lado direito da capela que comunicava directamente com a torre e com o interior da própria capela. 

O convento dos Carmelitas é o edifício em ruínas mesmo em frente á capela. O da segunda foto que mostrou é uma fábrica abandonada (ver meu blogue, poste 36)

Entramos e com cuidado fotografamos tudo o que conseguimos, tudo mesmo. Saímos de lá sempre rápido pois sabíamos que era errado estar ali e não fosse aparecer algum delinquente ou assim.

Fotos que consegui tirar depois de subir ao cimo da torre , tal como a talha dourada, da qual não se encontram fotos em lado nenhum... Bem, a meu ver são fotos tristes porque mostram um abandono e a falta de respeito pelo património arquitectónico, mas por outro lado são úteis na medida em que nos forçam a imaginar o “como era” ou o “como teria sido”, ou então tanto que seja só pelo curiosidade de ver o que trancam ali.




(um aparte meu: esta inscrição é curiosa pois a data não aparece nos escritos referentes à Capela actual nem à primitiva. Quererá referir-se a outra coisa ?)


Junto á fabrica ainda nos foi possível entrar nas pequenas habitações mesmo ao lado que pertenciam aos operários. Os objectos pessoais bem como outros bens eram variados.

... outras fotos da fábrica abandonada á beira rio na mesma rua da capela. É fácil identificá-la por quem passa do lado do Porto por ter uma espécie de "seta" na fachada, como mostra uma das fotos. O estado de conservação é semelhante senão pior, além de ter muitos lixos abandonados...


 ...fico sempre com aquela impressão de que saíram todos á pressa e deixaram tudo para trás.
Porque não vá o diabo tecê-las e de acordo com a nossa autora, a sua identidade ficará registada apenas como Palmela S. A quem desejo as maiores venturas para a sua futura vida profissional. E não só, claro.

Pormenor da escarpa da Serra do Pilar e a Capela

Uma nota minha: ... junto à capela do Senhor de Além – 5-3-1739 – cinco frades carmelitas calçados, fundaram um hospício que funcionou até 1832.
O edifício do hospício, depois de 1834, foi vendido e nele chegou a funcionar uma fábrica de louça.
Presentemente todo o edifício está em ruínas.
A actual capela, que mantém o culto, foi edificada, no lugar da antiga, em 1877.

Tem benfeitores muito fervorosos. (onde estão eles ?)
Este texto retirei-o http://www.lendarium.org/narrative/lenda-da-imagem-do-senhor-jesus/ tendo como fonte de origem Carlos Valle in Revista de Etnografia 26, Tradições Populares de Vila Nova de Gaia - Narrações Lendárias Porto, Junta Distrital do Porto, 1969 , p.426-428