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sexta-feira, 28 de setembro de 2012

142 - As Demolições no Morro da Sé

Muito vagamente, lembro-me do meu Pai falar das demolições na Sé e do problema de habitação para os seus moradores, ao mesmo tempo que contava histórias sobre a famigerada Avenida da Ponte.
Para nós, Portuenses, a Sé é muito vasta e não só o local onde se encontra a Catedral e o núcleo Monumental.
Sabemos que circundou o Morro da Sé ou de Penaventosa uma Muralha Primitiva, ou Sueva, afirmando-se ser romana do séc. III, assente em outros muros já existentes. Foi restaurada no séc. XII, do qual existe apenas um cubelo reconstruído no séc. XX.
Pormenor das demolições, projectadas no plano da Câmara do Porto em 1934 e que se prolongaram por vários anos.

 Cerca de 60 anos separam estas imagens

Essa Primitiva Muralha tinha 4 Portas, sendo a principal a de Vandoma. Ligava o Morro da Sé com o da Cividade, outro espaço grande naquela época, através da Rua Chã, chamada antigamente Eiras ou Chã das Eiras
Na foto superior esquerda, olhamos a Avenida da Ponte e à direita a Rua Chã. Na foto superior direita estamos no mesmo local mas no sentido contrário, isto é, a caminho da Ponte, ficando à direita o início da actual Calçada de Vandoma.
As fotos inferiores, mostram o que resta dessa Muralha e a Casa de D. Hugo, Bispo do Porto, construída em estilo gótico, entretanto demolida, aproveitando-se na reconstituição uma das paredes originais e a porta. Foi a este Bispo que D. Teresa, mãe de D. Afonso Henriques, concedeu o Couto da Cidade em 1111.
Nesta casa - o arqueossítio -, está demonstrada a mais longa existência humana da Cidade. Em apenas três metros de profundidade detectaram-se 20 camadas arqueológicas integrando ruínas arquitectónicas e espólios do séc. IV a.C.. Foram identificados vestígios do Crasto proto-histórico que deu origem à Cidade.
Mas as Demolições são o que interessam para agora.

Sensivelmente do mesmo local, podemos ter uma ideia de como era a Calçada de Vandoma e de como é actualmente

Adoçado à parede da Sé, foi colocado o Chafariz de S. Miguel, também chamado do Anjo, anteriormente localizado no Largo da Sé e que segundo o Igespar é considerada uma obra menor ao que tudo indica de Nicolau Nasoni. 
Mas voltemos atrás para espreitar a Porta de Vandoma e olhemos os desenhos e a aguarela abaixo reproduzidos. Talvez a mais correcta composição seja a de Joaquim Vilanova, litógrafo, a quem foram encomendados vários desenhos do Porto e não só. Conhecem-se cerca de 100. No entanto Gouveia Portuense desenhou-a e pintou-a com outro simbolismo. Com a imagem de Nossa Senhora de Vandoma no cimo. Tanto quanto se compreendem dos textos de outrora, era no cimo que a imagem estava colocada.
Como atrás referi, a Porta de Vandoma era a mais importante da Cidade, aberta na Muralha Primitiva. Segundo a lenda, uma armada de Gascões comandados por D. Munio Viegas no ano de 990, entraram no Porto para salvar a região dos Mouros - e aproveitar as suas riquezas, pois claro -. Juntamente veio o Bispo da localidade francesa (actual) de Vendôme, D. Nonego que posteriormente viria a ser Bispo do Porto e trouxe consigo uma cópia da imagem que estava na Catedral. Vitória conseguida, reconstruiram-se as Muralhas e a Porta por D. Nonego e no cimo foi colocada essa imagem.
A devoção popular foi tal que foi elevada Nossa Senhora de Vandoma, ou Nossa Senhora do Porto ou ainda Nossa Senhora do Porto da Eterna Salvação, uma das invocações à Virgem na Igreja Católica, a Padroeira da Cidade.
A devoção chegou pelos Portugueses ao Brasil como Nossa Senhora do Porto e tornou-se orago de algumas cidades como Andrelândia e Senhora do Porto, em Minas Gerais e Morretes no Paraná.
A imagem original e talvez outras posteriores desapareceram mas em seu lugar foi colocada uma no séc. XIV, que saiu para a Sé em 1855, não para o local actual, quando o Arco e as casas que lhe ficavam contíguas foram demolidas. Está actualmente do lado esquerdo do Transepto por indicação do querido Bispo do Porto, D. António Ferreira Gomes, que decidiu pela sua exposição ao culto.
O Casamento de D. João I em 1387
Painel de azulejos na Estação de S. Bento de Jorge Colaço

Conta Fernão Lopes, na sua Crónica D. João I, que o Rei D. João e D. Filipa de Lencastre se deslocaram do Paço para a Igreja. Segundo entendo, o Paço estaria próximo da Sé, dentro das Muralhas. Mas a história que nos ensinaram conta que os noivos entraram na Cidade. Sendo assim, Jorge Colaço retratou (penso eu) a história popular, embora só o pudessem fazer pela Porta de Vandoma, a única que permitia a entrada de carros. Mas esta reprodução da Porta não é em nada parecida com as que se vêm nas fotos acima referidas. 
Outras histórias do Casamento se podem encontrar, uma das quais o Rei veio a correr para o dito, depois de pôr em ordem com umas espadeiradas lá pelo Norte uns galegos atrevidos. Por outro lado, os nobres entravam na Cidade pela Porta Nobre, ou Nova, em Miragaia, depois de atravessado o Rio e vindos do Castelo de Gaia. Parece mesmo que a futura Rainha já estaria no Paço enquanto o Rei estava algures...mas lá foi ter para a cerimónia, afinal a confirmação do tratado de Windsor - feito em 1373 com a Inglaterra - , ainda hoje em vigor.
Para finalizar, lê-se na Toponímia da Câmara Municipal que o primeiro documento que refere a Porta é de 1413. Ter-se-á perdida outra documentação, sendo a Porta tão antiga ? 

Caminhemos pela Calçada de Vandoma - não sei se ainda se chama assim - mas fica-lhe a toponímica eternamente. Antes das demolições, em frente da Sé ficavam algumas casas brasonadas. Hoje temos a chamada reconstituição da antiga Casa da Câmara ou dos 24, da última década do séc. XX, do Arq. Fernando Távora. Não são só os portuenses que não gostam do "Monumento" - por não acharem o seu enquadramento condizente com a monumentalidade do sítio. Realmente, é mais que feia. Mas que fazer...

Voltando à esquerda para o actual Terreiro, em frente da porta principal da Sé ficava a Capela de Nossa Senhora de Agosto e de São Bom Homem, padroeiros da Confraria dos Alfaiates. Ainda hoje conhecemos a Capela como a dos Alfaiates. A imagem era venerada desde o início do séc. XVI no primeiro andar de uma casa cujos baixos eram os Celeiros do Bispo. Em 1554 iniciou-se a construção da Capela, que foi desmantelada em 1936.
Ao fundo das fotos, o Paço Episcopal.

Em 1953 a Capela foi reconstruída no local actual na Rua do Sol, próximo da antiga Porta ou Postigo do Sol, aberto nas Muralhas Fernandinas. É Monumento Nacional desde 1927.
Possui um conjunto retabular executado entre 1590 e 1600 por Francisco Correia e seus colaboradores. Para os apreciadores de arte, é pena não se encontrar regularmente aberto este edifício.

As casas foram sendo demolidas no Terreiro. O Paço Episcopal, talvez o edifício mais monumental da Cidade, é pelo menos em grande parte da autoria de Nasoni. Foi construído totalmente após a demolição do anterior.
É uma pena não ser visitável. Disse-me um funcionário que também acha o mesmo, pois sempre falaria com as pessoas, não se cansava tanto por estar horas a fio parado, a olhar os turistas que por ali andam e se sentiria útil.
Mas como nem tudo é mau, podemos fazer uma visita virtual ao Paço através de:
http://www.diocese-porto.pt/visitavirtual/

O novo Terreiro, de costas para o Paço. É uma pena aquele mamarracho lá ao fundo.

A Torre Medieval ou Torre da Cidade, é uma casa-torre medieval que estava escondida entre o casario. Eram por aqui também os antigos açougues do Bispo. Após as demolições foi reconstituída deslocada 15 metros do local original. Albergou o Arquivo Histórico da Cidade e também um centro social depois de Abril de 1974. O Largo agora chama-se de D. Pedro Pitões, antigo Bispo do Porto
Foi-lhe acrescentada uma varanda gótica, mas francamente não sei qual é pois conheço duas que me parecem iguais. Nas costas construíram-se uns arcos, presumo para relembrar a antiga Porta de S. Sebastião.
Relendo este texto em 3.Set.2016, resolvi acrescentar que os arcos serão os da antiga Porta de Vandoma. Foi escrito numa crónica em Agosto no Jornal de Notícias do prof. Germano Silva.

Os açougues do Bispo estiveram aqui até ao séc. XIX, não os primitivos do séc. XIII que estavam na Rua de Penaventosa, chamada na altura de Palhais. Os últimos ostentaram sobre a porta uma pedra vulgarmente chamada Pedra do Porto e posteriormente apenas o Porto. Anteriormente, em 1293, esteve numa das casas do Cabido na Rua das Eiras - ou Chã das Eiras, hoje Rua Chã.

Não foram só a Calçada de Vandoma e o Largo da Sé, hoje Terreiro da Sé, que sofreram demolições. As ruas do velho burgo também as sentiram. Embora com muitas recuperações, principalmente a partir dos anos 80 do séc. XX com o programa Cruab e a elevação do Porto a Capital Europeia da Cultura, muito se fez nas zonas degradas, que as demolições dos anos 40/50 não cumpriram. Seguiu-se-lhe a Porto Vivo-SRU, que segundo conhecedores, mais parece uma coisa clandestina.
Junto à antiga Casa da Câmara ou dos 24, arrasaram-se todas as habitações. Ficaram as ruínas da medieval Casa. Hoje recuperadas, como simbolismo da democracia da Cidade no séc. XVI. Pena foi que o Arq. Fernando Távora não tenha pensado um projecto melhor para manter vivo este símbolo da Cidade. Mas já escrevi anteriormente sobre o que nós, portuenses, pensamos do seu projecto e da colocação do velho PORTO, que esteve encimando o edifício da antiga Câmara na actual Praça da Liberdade e que já foi de D. Pedro, Praça Nova e para nós, simplesmente A Praça.
Rectificando em 2016, a estátua do Porto encontra-se na Praça da Liberdade, no passeio junto ao Banco de Portugal.
No sopé do pequeno morro onde se encontram as ruínas da Câmara dos 24, esteve o chafariz da Rua Escura, mesmo encostado ao Oratório de S. Sebastião. Durante as demolições a que me venho referindo, foi transladado em 1940 para as costas do Muro que foi construído delimitando o Terreiro da Sé de uma cota mais baixa, intermédia ao Colégio e Igreja dos Grilos. Este chafariz do séc. XVII é uma das principais obras antes do impulso do Barroco e de grande utilidade no abastecimento de água à Cidade.
Fico impressionado como na pagina do Igespar leio que está na Rua de Pena Ventosa. Mas é Largo do Dr. Pedro Vitorino o nome do artéria onde se encontra. Para o caso, é mais um pormenor.
Por vezes dou-me ao capricho de reparar nos cicerones que arrebanham os turistas. Enfiam-do-os na Sé, não se dão ao trabalho de os fazer apreciar o Chafariz de S. Miguel, nem a Galilé, nem o Paço Episcopal - infelizmente só a frontaria - , nem o Chafariz da Rua Escura e nem, ai como doi, os miradouros sobre a Cidade Medieval e a Igreja dos Grilos e o Museu de Arte Sacra. Já não referindo a Casa-Museu Guerra Junqueiro, por detrás da Sé de quem vem do Arqueossítio.
 
Não sei a idade nem quando surgiu o antigo Mercado da Rua Escura. Era assim conhecido, embora as bancas se estendessem também por S. Sebastião e outras Ruas. Lembro de uma velha familiar querida vir aqui comprar peixe. Pescada principalmente, porque confiava nas vendedeiras, logo na qualidade e frescura do produto, embora o regateio do preço fosse obrigatório. Temos hoje o mercado de S. Sebastião em edifício próprio.
O Terreiro da Sé visto do Interior da Catedral ou da Casa do Cabido, já não me lembro. O Pelourinho de estilo Manuelino é apenas de 1945, construído para alindar o espaço. E sem dúvida que consegue.

Várias imagens do Morro da Sé, em épocas distintas. Este é o lado mais conhecido e visível desde o Morro da Vitória.
Porque uma coisa bate na outra, isto é as demolições por causa da Avenida da Ponte - ver um escrito anterior - e as da zona envolvente da Sé ordenadas pela Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais entre as décadas de 30 e 40 do séc. passado, disse-se  por causa de um conceito higienista e resolver o problema da degradação física e social do Bairro, talvez mais não fosse do que criar um espaço para o movimento automóvel desde a Avenida dos Aliados/Praça da Liberdade para o sul através do tabuleiro superior da Ponte D. Luíz.
À monumentalidade que agora podemos visitar, talvez não seja estranho um certo cunho fascista-italiano pelo gosto das grandes praças e largas avenidas já vocacionadas para o trânsito automóvel. Afinal, dois projectistas italianos estiveram entre nós, Muzio e Piacentinni e alguém terá aproveitado um pouco dos seus trabalhos.

Nunca seria capaz de reconstituir alguns factos nem histórias que tentei transmitir se não tivesse lido. A autores fui respigar alguns pormenores dos seus livros: Arnaldo Gama, Alexandre Herculano, Germano Silva. Embora correndo o risco de não ter anotado todas, visitei páginas das quais destaco:
http://monumentosdesaparecidos.blogspot.pt
http://www.queirozportela.com/artigos.htm
http://quintacidade.com/2010/04/03/planeamento-urbano-e-automovel-no-porto/
http://joelcleto.no.sapo.pt/Arqueologia.htm
http://www.apha.pt/boletim/boletim1/pdf/PortoAntigoPortoNovoJFA.pdf

http://aportanobre.blogspot.pt/2009/09/porta-nobre-da-cidade-do-porto.html
http://doportoenaoso.blogspot.pt/2010/07/apontamentos-sobre-as-armas-do-porto.html
http://www.portoantigo.org/

As fotos antigas fui-as conseguido em vários locais.

sábado, 22 de setembro de 2012

141 - O Porto em Miniaturas

Ia-me fugindo a exposição já há meses patente numa secção dos antigos armazéns da Estação de S. Bento, do lado da Rua da Madeira. A entrada é pela gare da Estação, à esquerda, junto ao primitivo cais da Linha 1.


Parece que terminará amanhã, dia 23. Talvez vá ser exposta noutro local.

Esta é a História do autor, projectista, arquitecto, empreiteiro, construtor, enfim, do Homem que realizou esta obra.
Tanto quanto se lê e eu depreendo, a Colecção pertence ou pertencia ao senhor Adão (Oculista) que a cedeu à Porto Social,  ( http://bonjoia.org/p/fundacao/mensagem ) e esta por sua vez a cedeu à empresa de publicidade e marketing Soluções com Pinta para promover a sua divulgação.
Logo, deve gerar lucros para uma empresa privada, pois esta não anda a fazer favores a ninguém e muito bem, mas são uns dinheiritos a menos que entram para a Fundação, que, transcrevo: é uma instituição de direito privado sem fins lucrativos, com personalidade jurídica, estatutos aprovados, instituída pela Câmara Municipal do Porto com a Missão de “Promover a Inclusão e a Coesão Social” no Concelho do Porto
Na recepção, apenas uma gentil senhora, que não sei se pertence à empresa privada se à Fundação ou a outra entidade.
Cá vão fotos de algumas maquetas, conforme lhe chamam.

Quiosques
Embelezavam jardins, praças, locais públicos. Vendiam-se neles tabaco, jornais, bebidas, artigos de papelaria, selos de correio, flores.
No Porto ainda existem alguns dos antigos, reconstruídos, mas creio que não estão abertos.
Origem da palavra é turca - Kosk

Igreja de S. Roque, à Corujeira em Campanhã e Igreja Românica de Cedofeita.

Urinóis públicos. Na Fonte da Rua Chá, do lado esquerdo, na Rua Cimo de Vila existia um urinol, há bem pouco tempo desactivado.

Outra bela maqueta de uma peça muito útil de mobiliário urbano. Há alguns urinóis ainda em funcionamento. O mais vistoso e elegante é sem dúvida o do Jardim do Passeio Alegre. Não conheço interiormente o do das senhoras.

Igreja de S. João da Foz

Casa apalaçada em Ramalde que não conheço.

Conjunto Monumental da Sé

Igreja e Torre dos Clérigos

O Antigo Palácio de Cristal, Jardins e Lago
Uma obra destruída por um estúpido presidente da Câmara do Porto, coronel militar.
Para construir o Pavilhão dos Desportos, vulgo cogumelo.

Ponte Pênsil.
É uma pena ser tão desproporcionada

Estação de S. Bento
Um extraordinário trabalho

Uma vista de parte da exposição

Outros pormenores

Um Presépio curioso

Este é o bilhete da entrada. Esqueci de perguntar se a terceira idade tinha desconto. Sei que as crianças até 10 anos não pagam. Mas para as Finanças do meu pobre País lá fiz mais uma contribuição de 37 cêntimos. Se fosse para o bem da cultura, como diria Churchil, cortar em tudo menos nela.

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

140 - O Nosso Douro Lindo

Velhos amigos combinaram fazer um almoço fora do ambiente tradicional da nossa Cidade do Porto e aproveitando os descontos que ainda a terceira idade usufrui na CP, escolheram a Régua como destino.
Em Campanhã esperámos o comboio e na linha onde devia parar vindo de S. Bento, o painel informativo não informava nada sobre ele mas sim sobre um sem paragem. Pensámos que seria um comboio para a recolha. A hora estava a aproximar-se e a informação continuava. Chegou um comboio que parou. Como levava passageiros, entramos. Não havia dúvidas, era o nosso. E a informação lá continuou no painel.
Preparamo-nos para a viagem e olhar o que a natureza tem para nós guardada.

Mesmo com os vidros sujos das janelas, não se pode deixar de colher algumas imagens. Para o Peixoto eram apenas campos.

O Rio Tâmega vindo desde a Galega Ourense, depois de fertilizar a belíssima Veiga de Chaves, lança-se em direcção a Entre-os-Rios onde vai abraçar o Douro.

Depois do Marco de Canavezes, entra-se no troço do Juncal ligando à Régua, concluído em 1879. Passado o túnel, o comboio chega-se ao Rio Douro e em cada volta do caminho, uma surpresa.

É difícil controlar o ímpeto e não deixar de fazer mais um boneco.

A Estação de Aregos, ou de Caldas de Aregos, tomou o nome de Tormes inventada por Eça de Queiróz na Cidade e as Serras, onde o Jacinto e o Zé Fernandes desembarcaram, vindos da Boémia Paris, atravessando a Espanha onde as malas se perderam no transbordo. Era a referência à Linha Ferroviária do Douro Internacional. Aos amigos interessados, posso ofertar via net, esta obra magnífica, que o autor já não foi a tempo de corrigir totalmente, levado cedo pela morte. É editado o livro em 1901, postumamente. Aqui é Santa Cruz do Douro onde está sepultado. (Eça de Queiróz - Póvoa de Varzim, 25.Nov.1845 / Paris, 16.Agosto.1900)  
Nesta Estação desembarcava quem ia para as famosas e antiquíssimas Termas, do outro lado do Rio cujas águas medicinais a 60º já eram bem conhecidas dos Romanos. Consta-se que foi aqui que D. Afonso Henriques curou a sua perna e a Rainha sua Esposa mandou construir um lazareto.
Eram barqueiros que faziam a travessia, em barcos a remos, de pessoas e bens. Hoje é uma lancha que o faz e as Termas são um belíssimo complexo turístico.

Desta vez o horário foi cumprido e também vinha bem composto de passageiros, principalmente estrangeiros. A senhora dos Rebuçados da Régua no seu posto de trabalho, tradição vinda dos anos quarenta do século passado. Também já foram vendidos no Porto, logo à saída da Estação de S. Bento. Uma delícia estes rebuçados, cuja paladar varia conforme o segredo do fabricante perante os "pósinhos" que lhes adiciona. Uma saqueta com 9 custam apenas 1 euro. Mas cada rebuçado, chupado nas calmas, dá para 10 minutos...

Há dois meses, o largo da Estação estava numa confusão tremenda de obras. Hoje, a confusão continua, mas não vi uma única pessoa a trabalhar e as máquinas lá estacionadas.

O nosso camarada Fernando Súcio esperava-nos. Entretanto havíamos pensado almoçar em qualquer lado e combinamos uma passeio ao Pinhão só a duas dezenas de quilómetros. O Fernando puxou pela carola, enfiou pela velha ponte e já estávamos no concelho de Lamego.
Ligando as duas margens existem 3 pontes, mas estas duas são as que interessam para o caso. A de arcos de ferro, à esquerda, foi construída em 1872 e veio substituir o transporte de pessoas e bens em barcaças entre as margens. Foi ou ainda está a ser recuperada para uso pedonal e de bicicletas. A de pedra é da 2ª vintena do séc. XX. e pensada para trazer o comboio para este lado, vindo da Régua e até Lamego, mas deu em nada o projecto. Passou a ponte rodoviária tendo-se desactivada a de ferro.


Estamos do lado que pertence a Lamego, isto é, na margem esquerda do Douro e por aí vamos seguir até ao Pinhão, para leste. A meia dúzia de quilómetros encontramos a barragem de Bagaúste, finalizada em 1973.


Quis o tempo atrasar as vindimas por todo o País, mas prometendo um ano muito bom. Assim seja. Beber vinho é dar de comer a um milhão de Portugueses, já dizia Salazar. E a maioria dos acidentes rodoviários não é por causa do Vinho Português. Ao longo da estreita estrada, à distância de um braço, as cêpas estão lindas, esperando para breve as mãos que vão colher o seu fruto.
Passaram por nós, apressados, porque é o seu trabalho e nós apenas turistas a parar a todo o momento, carrinhas carregadas com uva branca, essas já no ponto próprio que os especialistas determinaram poderem ser vindimadas.

A foz do Rio Távora, vindo de mais de 50 quilómetros desde Trancoso até junto a Tabuaço ajuda a engrossar o Douro. Está escrito que neste local, no Inverno formavam-se os piores rápidos desde Barca D'Alva até à Régua. Um sorvedouro de Rabelos e Homens.
Passar a repetir-me é o que pode mesmo acontecer. O nosso pára-arranca foi maior do que andar de carro numa cidade desorientada.
As pequenas estradas foram construídas entre os Morros e o Rio, desde há uns anos domado pelas inúmeras barragens que lhe foram construindo no seu percurso. Os Morros, desde tempos suevos e aprimorados pelos romanos, foram uma herança que os naturais souberam aproveitar e ainda mais desenvolver, construindo os seus socalcos em xisto segurando-os com oliveiras e no seu meio meteram-lhe cepas de variadíssimas qualidades, afrontando as pragas que periòdicamente as vinham dizimar, mas juntamente com o clima conseguiram produzir não só vinhos de excelente qualidade mas também azeite e frutas diversas.
Para dentro de cada um rezamos esperando ver um comboio do outro lado. Orações ouvidas e aí ainda mal se descortinava lá ao longe, em uníssono gritamos: Olha o comboiooooo. Paragem obrigatória para captar todas as fotos que nos aprouve. Agradecemos ao deuses, o dos comboios pelo horário; ao do Douro, por podermos olhar mais uma maravilha.
E aí está o Pinhão. Foi só atravessar o Douro para a margem direita e a primeira paragem, debaixo de uma temperatura escaldante, obrigatoriamente tinha de ser para visitar a belíssima Estação Ferroviária, ex-libris da região do Alto Douro Vinhateiro, que viu chegar o primeiro comboio no dia 1 de Junho de 1880.
Os seus magníficos 25 painéis em azulejo da Fábrica Aleluia, de Aveiro, encomendados em 1937, em tons de azul, representam cenas culturais e históricas da faina duriense. Na sala de espera, algumas relíquias dos velhos tempos. E o relógio, esqueci de ver o fabricante (alô amigos, por acaso repararam no pormenor ?), funciona mesmo.

A barriga já estava a dar horas, afinal tinhamo-nos levantado de madrugada, mas uma foto para o nosso Museu Particular das Memórias era superior a todas as vontades.
A primeira porta que batemos tinha bom aspecto, pequenina e com comensais a dar ao dente, mas haviam duas mesas vagas à nossa medida. Como sempre o sentar foi de difícil escolha. O prato do dia, devidamente espreitado para o de um dos comensais, eram Tripas à Moda da Casa. E recolheu a unanimidade.
Embora houvesse Bacalhau e não tive dúvidas sobre a qualidade quando o vi na mesa ao lado, onde dois casais entradotes na idade, camones de origem, desgostavam o bicho; confirmou-se quando a camareira lhes foi perguntar se estava tudo bem e reparei no ar de uma das senhoras, enfartada, expelindo um grande bbfffuuu à mistura. E mais de um lombo da altura da mão travessa, na travessa sobrando.
Haviam na carta, Lombo de Porco, Vitela, Cabrito, ambos confeccionados assados. Mas eram as Tripas e mai'nada. Para aperitivar, queijnhos frescos, presunto fatiado à mão, melão, azeitonas pequenas brancas, curtidas, uma delícia. A sobremesa o tradicional semi-frio, só uma dose como é habitual para o único não doente do grupo, que provei. Vinho tinto muito, da casa, duriense pois claro, de paladar muito simpático, ligeiramente arrefecido. Cafés e Bagaço(s) do patrão, feito de vinho generoso.
No final uma agradável surpresa. Tudo por menos de 38 euros. O que me levou a perguntar se não havia engano. Como a factura se lia mal, quiseram-me descriminar a conta, escrita a tinta. Até compreenderem que me queria referir se o erro estaria contra eles, demorou um pouquinho. Mas estava tudo bem. Cumprimentei o chefe, calculo que esposa e filha em idade escolar, e a Linda Mineira que nos serviu com uma gentileza muito grande.
A casa fica mesmo em frente à estação, ligeiramente descaída para a direita para quem está de costas. Um aviso, mesmo para os que não são benfiquistas: podem entrar à vontade porque qualidade, preços em conta e simpatia não faltam neste Motivo.
Andar um pouquinho fez bem. Lá no alto preparam-se terrenos para novos plantios.

Algum artesanato à venda em vários locais a preços convidativos.

A Estação vista da gare.

Há que voltar à estrada e ver o Rio Pinhão desaguando. Da entrada de uma Quinta, avista-se o monte da Quinta das Carvalhas, uma das mais famosas da região, com a sua casa lá no alto para turista ver e usufruir a belos preços.
As paragens continuaram e há coincidências interessantes.

Sobranceira ao Rio Pinhão, com uma vista fabulosa, existe uma casa onde entramos para fazer perguntas. Conversa aberta e o senhor Tigelas apresenta-se. Barbeiro e Tasqueiro de profissão, tem sido muito requisitado para reportagens. Mostrou-nos a última, da Visão da semana passada com histórias sobre o Douro (publiquei-a no meu espaço do facebook) mas também lá tem um recorte do Jornal de Notícias, feita há uns tempos atrás. Entre palavras, oferece-nos um Bagaço do Patrão. Quis comprar um garrafão mas disse que só tinha pouco mais de meio litro. Nem sempre a vida nos sorri...
A Ponte e o Rio Pinhão visto das traseiras da sua casa que nos abriu totalmente.

Passada a Ponte, um saltinho até mais acima para espreitar o que se passa.

É a foz do Rio e a Ponte Ferroviária.

Pés ao caminho e no sobe e desce, o amigo Teixeira lembrou-se que tinha um amigo por ali a quem quis visitar. O amigo Correia não estava em casa, mas neste mundo nada se perde. E é um outro Douro sem o Rio que encontramos.

E até umas nuvens lindas apareceram no céu azul, deixando sombras nos montes.
Agora as paragens são menos frequentes, já olhamos para o relógio a pensar na Régua e no comboio das 17h14m. Mas Alijó e Favaios são por aqui e estas terras num planalto grandioso a 500/600 metros de altitude pertencem-lhes. Favaios, segundo historiadores, deve o seu nome latino a Flavius, uma antiga povoação romana de Panoias, Vila Real.
Famosíssimo e Internacional é o vinho moscatel que a Adega Cooperativa produz, um excelente aperitivo. Mas também se produzem Vinhos de Mesa, Porto e Espumantes.

Estamos na Régua ainda a tempo para uma loirinha no bar da Estação e comprar os Rebuçados. O Fernando Súcio é uma máquina de controle perfeito.
Ficamos admirados com a quantidade de passageiros. O comboio estava atrelar máquinas e vagões.
As carruagens apresentavam este aspecto magnífico e a composição ficou enorme.

No interior não havia lugares sentados para todos os passageiros. Presumimos por conversas telefónicas que ouvimos a um funcionário e outras trocadas com agentes de turismo, que a CP é uma empresa relaxada, não ligando às reservas que lhe são feitas com antecedência, não cuidando dos interesses nacional-turísticos, um filão que poucos compreendem ou talvez não tenham mesmo interesse em compreendê-los. E assim vai Portugal...

Regressados ao Porto e a Campanhã, depois de um dia escaldante mas belíssimo, cheios de sede, não demorou nada para no Metro duas loirinhas tomarmos e comer uma fatia de bola de carnes para encher.

Desculpem, caros amigos, pelo grafismo péssimo da página. Já estou farto de tentar arrumar e não consigo arrumar nada. Portanto fica assim mesmo.
E não esqueçam de vir ao Douro. Ele é enorme e tem maravilhas para todos os gostos.