Pesquisar

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

167 - Campanhã - A Oriente da Cidade do Porto.

Havia prometido aos meus amigos um reconhecimento das Grandes Quintas de Campanhã.
Três delas já as havia referido nas postagens 126 e 157. Ficam aqui as suas imagens só para relembrar.
 Quinta das Areias. Hoje é o Horto Municipal. Alguém sabe se é visitável ?
Escrevi ao Município mas até hoje sem resposta.
Quinta de Bonjoia
Quinta de Vila Meã
Hoje um espaço abandonado, a ruir, quer queiram quer não os Amigos da Natureza. E o meu amigo Quintino Monteiro a ver uma casa cheia de recordações neste estado.Só eu sei a dor que lhe senti na alma quando me explicou o que era esta Quinta e esta Casa.

Adiante, porque lhes quero apresentar mais duas Quintas, meus amigos. E tanto quanto possível, contar-lhes umas simples estórias pessoais junto às histórias das Quintas. Mas devo-lhes dizer que quási todas as fotos são do meu período pré-histórico da fotografia digital e das viagens a pé e a pedir por este escondido e meio-ignorado lugar de Campanhã. 
Vou tentar dar a conhecer com mais esta postagem a freguesia que me acolheu durante uns anos e que só há bem pouco tempo fui descobrindo. CAMPANHÃ tem várias postagens minhas. É fácil de encontrar. 
Prossigamos então:
Já referi anteriormente que Campanhã era um lugar essencialmente agrícola, onde nobres e proprietários abastados estabeleceram Quintas e Casas de Campo. 

 Quinta da Revolta
Não se sabe ao certo o porquê do nome. Poderá derivar de uma revolta que se deu aqui durante as invasões francesas mas também pode ter sido durante o reinado de D. Maria. Presumo que o historiador de Campanhã se deve querer referir à segunda Maria Rainha, filha de D. Pedro IV. e não à primeira, filha de D. José I. No entanto o nome de Revolta já é conhecido em 1690, morando nela o Álvo Brandão. Por conseguinte, em qualquer um dos reinados de uma das Marias se poderia ter dado uma revolta. 
Mas o nosso historiador simplifica a coisa e diz que talvez a revolta seja de uma curva e contra-curva que a quinta incorporava. Volta e revolta. 
Não sei se alguém a conhece com o nome de Revolta. Mas se ouvirem Horto Moreira da Silva ou Horto do Freixo, todos saberão. Pois comigo foi igual. O nome do Horto ouvi-o desde pequenino pela voz do meu Pai. Era de lá que trazia plantas simples para o nosso quintal, o pinheiro do Natal, às vezes um enorme pinheiro, o musgo para a cascata de S. João. Pelas conversas dele, calculava ser um espaço enorme. E deve ter sido.
Não tenho a certeza, mas a quinta - o que foi dela -  deve estar muito cortada. O Rio Tinto passa-lhe ao lado ou pelo meio, não sei, e o enorme espaço onde está actualmente uma central de tratamentos de resíduos ou esgotos deve-lhe ter pertencido. E parte da Estrada da Circunvalação. Pois chegou a ir até Bonjoia, de onde anexaram uns terrenos.

O edifício apalaçado simples será do séc. XIV ou XV e a Capela dedicada a Nossa Senhora da Conceição - a minha santinha - é referida em 1758. A pedra de armas é do séc. XVIII. A quinta vai passando de herdeiros em herdeiros, uns por casamentos que se juntam a outras famílias, os Azevedos, talvez os de Campanhã, depois o Visconde de Balsemão (o do Palacete da Praça de Carlos Alberto) até que fica abandonada e em ruínas o palacete.
É emprazada em 1851 que não resolveu nada e em 1866 é vendida a José Duarte Oliveira, próspero comerciante do Porto que a deixou a seu filho Júnior, um viticultor afamado e ilustre escritor-investigador agrícola. Junto com o dono do famoso Horto das Virtudes José Marques Loureiro, fundam e produzem o Jornal de Horticultura Prática durante cerca de 20 anos.
Por essa altura a quinta dava 300 a 400 pipas de vinho. Deveria ser obra.

Em 1921 passa finalmente para as mãos de Alfredo Moreira da Silva, Horticultores e Fluricultores. Lembram-se com certeza os meus amigos e não só os portuenses, do Horto Moreira da Silva próximo do Palácio, na Rua Júlio Dinis, cuja pedra junto à entrada ainda mostra a mancha da pêra que foi nela gravada. Paredes meias com o CICA 1 (?) antigo Metralhadoras 3, hoje um anexo do Hospital de Santo António/Universidade do Porto, creio. E que afinal era a entrada do Horto das Virtudes, totalmente retalhado hoje em dia mas onde existe uma parte chamada Jardim das Virtudes. Umas vezes aberto outras fechado. Hoje não sei. Outras histórias.

Não sei qual o espaço existente hoje da Quinta. Mas de Horto e Fluricultura quem passa por lá pouco ou nada vê. Disse-me um empregado que o horto é em Coimbra actualmente. 

Muito próximo fica a Quinta do Freixo. Provàvelmente poucos portuenses conhecerão ou ligarão o seu nome ao Palácio. Mas nunca há uma coisa sem a outra.
Brasão de Afonso Cunha que substituiu o dos Távoras, mandado picar aquando do processo.
Ler adiante

Vamos por partes. Conta a história de Campanhã que a quinta era enorme, até englobando a de Vilar d'Allen (mais tarde lá hei-de ir). Pertencia em 1646 ao Capitão António Pires Picão, morador em Miragaia, mas que era aforada ao Cabido da Sé. É o que entendo. Em 1671 o filho Roque obtém a renovação do prazo e uma filha dele casa em 1683 com António Távora de Noronha Leme Cernache, opulento fidalgo da Casa Real e senhor de numerosos bens.
Reparem os meus amigos atentos quantas vezes escrevi ao longo destas minhas simples postagens o nome dos Távoras. Que já vêm desde antes da nossa nacionalidade. E com origem em Castela (España) Para o caso não interessa nada e prossigamos.   
Do casamento nasce o filho Jerónimo que virá a ser futuro Deão da Sé do Porto, Provedor da Misericórdia do Porto e Presidente da Irmandade dos Clérigos pobres. Dotado de grandes recursos financeiros manda vir de Malta onde se encontrava a trabalhar um tal Nicolau Nasoni. 
Pretendendo mandar construir na sua Quinta do Freixo um sumptuoso palácio, D. Jerónimo encomenda a obra ao tal Nasoni. Obra limpa, que deve ter começado a construir-se por volta de 1742, a parte da pedraria deve ter terminado em 1750 quando começaram as obras de madeiras. 
A Obra dos Jardins devem ter sido ajustadas por volta de 1744, cuidadosamente talhados à moda italiana, que desciam em patamares até ao Rio Douro.

As fachadas apresentam desenhos em três níveis diferentes, ditados pelos três terraços que ocupam. Coisa única em Portugal e adoptada para o Petit Trianon em Versalhes. França. 
Façamos um intervalo na história do Palácio do Freixo e deixem-me contar as minhas histórias.

Não lembro o ano, mas vimos e lemos todos os portugueses uma reportagem sobre uma festa qualquer (a minha falta de memória) relacionada com a União Europeia passada nos Jardins do Palácio do Freixo e quem a dirigiu foi José Manuel Durão Barroso. Achei lindos os Jardins, cheios de relva verde e a fonte com repuxo de água, etc.

Sei que foram pedidos fundos para a requalificação da Zona do Freixo - entre muitos outros - e que incluía a recuperação deste Palácio e Jardins. Em 1997 criou-se uma sociedade com o nome de APOR-Agência para a Modernização do Porto, SA para o fim. Na altura da festa (as reportagens assim mostravam) pensei que o Palácio e Jardins já estavam recuperados. Então um dia resolvi ir visitá-los. Santa ignorância a minha. Estava tudo encerrado. As fotos possíveis que fui fazendo do edifício foram do lado do rio, trepando ao muro. As da fachada leste, saltei pela Fábrica Harmonia, depois por trás do edifício programado para ser o Museu da Indústria e em equilíbrio precário lá fui batendo umas chapas. 

Passado uns tempos, soube que iria ser mostrada uma exposição sobre Salvador Dali. Agucei o dente e pensei que poderia ser uma espécie de dois em um. Lá fui todo contente, mas alegria durou pouco, só consegui fazer uma foto da sala de entrada, porque de imediato saltaram-me em cima os seguranças proibindo-me de fotografar. Francamente, assustei-me, pois tantos os meninos como as meninas além de não serem nada gentis, mostravam-me caras de pitbull. Só pode fotografar o exterior se quiser.
No entanto ainda consegui fazer umas 3 ou 4 fotos clandestinamente, nas varandas que se encontravam abertas. Péssimas.
Concluindo, o Palácio não estava recuperado, havia paredes com manchas em cima das pinturas desbotadas, salas onde não se podia entrar.   
Fachada Oeste
Lá vim até aos jardins para sofrer nova desilusão. Nada recuperados. Ficam as fotos para os amigos imaginarem como eram na altura. Mas adiante com a história. 

Por causa do processo dos Távoras movido pelo Marquês de Pombal, o Palácio fica decadente e passa para os Viscondes de Azurara sendo vendido em 1850 por 15 contos a António Afonso Velado, abastado comerciante do Porto enriquecido no Brasil, agraciado por D. Luíz I como Barão e depois Visconde do Freixo. (1865 e 1872). O tal que mandou fazer o Brasão da primeira foto.
Este Barão/Visconde altera a característica do Palácio, tanto exterior como interiormente e instala uma fábrica de sabão nos jardins...Faz uma grandiosa recepção à família real que vieram assistir às obras da Linha do Minho em S. Roque em Julho de 1872. 
Após o falecimento do Visconde a viúva vende tudo a um súbdito alemão, Gustavo Peters, que junto ao Palácio monta uma destilaria de cereais. Aquilo um dia ardeu tudo e em 1890 parte da quinta e o palácio foram vendidos a José Maria Formigal. O restante foi vendido a outros particulares.
Mais tarde, as Moagens Harmonia compraram casa e terrenos, fizeram silos e novos silos e nova fábrica e tudo o conjunto se perdeu. Até o portão que dizem ser monumental, foi vendido para uma quinta em Ponte de Lima.
Em 1986 a Secretaria de Estado e Formação Profissional comprou o Palácio à Moagem Harmonia para montar um centro de formação profissional. Belo dia uns energúmenos pegaram fogo ao Palácio e destruíram todo o património artístico.
Uma das salas da exposição Dali
A Câmara Municipal do Porto tomou posse do conjunto que foi recuperado pelo arquitecto Fernando Távora e seu filho Bernardo, descendentes dos primitivos donos. Entre 2000 e 2003. Bom, isto não será totalmente verdade, pois as minhas fotos são de Outubro 2007 e recuperada, julgo eu, vi a sala da entrada. E alguns pormenores em outras salas. Tudo o resto foi como encontrei e contei.     

A Câmara Municipal vendeu todo o conjunto, incluindo o edifício onde deveria ser instalado o Museu da Indústria (edifícios cor de rosa) ao grupo Pestana que aí fez uma estalagem 5 estrelas. Gostava de conhecer. Pode ser que um dia me encha de coragem e vá até lá a ver se sim.
Na foto, os silos da Harmonia em destaque, o Palácio meio escondido e pormenores da Marina e da Ponte do Freixo.
O Palácio é Monumento Nacional desde 1910.

Textos compilados em Wikipédia, Monografia de Campanhã http://www.j-f.org/monografia/, Dias com Árvores em http://dias-com-arvores.blogspot.pt/ e Igespar - Palácio do Freixo
Localização das duas Quintas