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domingo, 10 de agosto de 2014

192 - CRESTUMA DE NOVO

Poderia dizer que a Meteorologia me ia arruinando um dia que acabou por ser mais um aprendizado de história. Explicando tudo tim-tim por tim-tim.
Depois das minhas visitas a Crestuma nos últimos dois meses com os meus amigos e camaradas Bandalhos do Bando do Café Progresso - ver reportagens em   http://bando-do-cafe-progresso.blogspot.pt/ - ficou combinado que o camarada Zé Ferreira, mais conhecido como Zé Catió, me iria ciceronar por Crestuma, sua terra de adopção.
Tudo combinado para ontem (enfim, já foi há 3 dias) dia 7 mas eis que a página da Meteorologia nos informa que vai haver chuva da grossa, principalmente de tarde. De manhã seria tempo de nuvens pesadas.
Telefonema para o Zé a pedir para adiar, mas o rapaz andava na pesca dos achigãs com o compadre Romualdo para os lados de Foz Coa. Já era madrugada quando conseguimos contacto. Expus-lhe a situação meteorológica. Tás maluco, não podemos adiar. E que vou fazer às Tripas que encomendei ? diz de lá do outro lado do fio telefónico, o Zé. Falou em Tripas, arrumou-me. Tá bom Zé, eu vou. Espera-me na paragem do Metro do Corte Inglês. Pensei para mim, se não poder fotografar, nem tudo se perde, sempre vão as Tripinhas.
Agora vamos para o Dia da História de Crestuma.
No centro da Cidade do Porto caíam umas pinguinhas mixurucas. Fui até à Trindade apanhar o Metro para Gaia, servi de cicerone durante a viagem as uns companheiros camones ocasionais que queriam ir tomar um aperitivo às Caves de Vinho do Porto. Estavam no transporte errado mas se caminhassem desde o Jardim do Morro até à Ribeira de Gaia não lhes faria mal algum.
Quando saímos do Túnel de S. Bento e entramos na Ponte Luís I já o sol estava a dar um ar da sua graça.
Clube Náutico e o Parque Botânico do Castelo
à direita o Rio Douro
Foto feita em 10.60.2014
À minha espera também o amigo Romualdo. Então resolvemos começar a viagem pelo Parque Botânico do Castelo

Não sou muito bom a subir e sei que me espera uma caminhada de respeito. Encho o peito de ar e lá vamos nós.
Devido ao acidentado do percurso, foram criados uns apoios em ferro. Era um caminho de carro-de-bois que saíam da antiga Quinta para trabalho na Fundição. Lá iremos

A elevação é um esporão rochoso em xisto com a altitude de 57 metros. Vamos vendo o que o homem deixou por ali.
Entre degraus, umas escavações que parecem assentos.

 A flora está devidamente referenciada. 
A elevação cai abrupta sobre a margem do Rio Douro. Nos vários patamares foram criados lugares de descanso e de lazer.

 Pégadas ou o ensino de como se dever subir o Monte.

Nos muros de suporte dos socalcos vêm-se numerosas pedras aparelhadas, de granito, matéria prima estranha ao local.

Escavações arqueológicas ocorrem no mês de Agosto desde 2010. Este mês ainda não chegaram os arqueólogos. Talvez por falta de dinheiro.


Uma Oliveira que a natureza foi comendo


Provavelmente uma conduta de água

 Da meia encosta, uma panorâmica sobre o Douro e a Barragem de Crestuma-Lever.

Pressupõem-se que este lugar foi intensamente ocupado entre os séculos IV e VII da nossa era. Isto é, entre finais do Império Romano e os começos da Idade Média. No entanto já anteriormente deveria ter sido ocupado por outros povos.

Por toda a elevação  são numerosos os entalhes, aplainamentos  e buracos onde se supõe que seriam colocados postes para formar as casas e suportar os telhados.

Pelos vestígios encontrados será de supor que as casas teriam telhados formados por telhas romanas, cada peça de razoáveis dimensões. Caixas com 1m3 contêm os achados arqueológicos já encontrados.

A Casa da Eira. Recuperação de uma edificação já existente. Este espaço pertencia a uma quinta em ruínas e recuperada pela Câmara de Gaia. O seu dono era o mesmo da Fundição lá em baixo, cuja parte do edifício foi aproveitado para instalar o Clube Náutico de Crestuma.

Uma recordação com o amigo Romualdo

Um buraco escavado provavelmente para a fixação de um poste de uma casa. A enorme árvore tem parte das suas raízes à mostra.

Embora com dificuldade de acesso um pouco alto, os caminhos estão devidamente sinalizados. Os serviços recomendam cuidado com as crianças e não aconselhado a deficientes motores e idosos.
É um prazer caminhar pela mata e observar os detalhes que os homens foram deixando ao longo de séculos.
Um pormenor sobre o Rio Douro a caminho da Foz, no Porto.

Na praia de Favaios, prevê-se que existiu uma estrutura portuária ou de atracagem. Há poucos anos, na maré baixa, conseguiram fazer recuar as águas e verificar debaixo da areia placas que poderão indicar ter havido um porto. 
Podem ler-se os relatos dos trabalhos em http://www.portugalromano.com/2012/09/cais-romano-de-crestuma-vila-nova-de-gaia/cais-romano-2/, que publicando fotos cedidas pelos responsáveis edílicos, não nos permite copiar. Bem hajam Ó Portugal Romano.
Talvez estas enormes pedras formando um muro seja uma antiga fortificação para defesa da área portuária.

 Vamos caminhando para o ponto de apoio que é o Clube Náutico de Crestuma.

Este caminho seria uma primitiva passagem para o Castelo com ligação ao Rio Douro. Provavelmente utilizado depois pelo pessoal da Fundição.

 O descanso e retempero de forças do caminhante escalador.
Mas não choveu

Aproveita-se uma volta pelas instalações do Clube para ver o Galardão que é ofertado para o melhor clube Português durante 4 anos.

 Já retemperado, uma pequena caminhada pelo sopé do Monte do Castelo.

 Uma árvore está suspensa no monte fronteiro.

 Na Ribeira da Arroba, um velho moínho recuperado.
Um recanto para se usufruir da natureza mesmo com o tempo triste

 Olhando para o Parque Botânico do Castelo

Vamos a caminho do almoço situado no lugar do Maroco,  um dos muitos altos de Crestuma. Já o Alberto nos esperava ansioso há mais de uma hora. Mas o trabalho não podia esperar, amigo. Fomos desculpados.

 E as prometidas Tripas à moda Porto, estavam deliciosas. 
Não podia haver melhor recuperação e preparação para as novas etapas 
que nos esperavam.

Do alto do Maroco a paisagem é soberba. Foto antes do almoço com o tempo nublado. Mas sem chuva.
Enquanto seguíamos com os digestivos, a Dona Rosinha fixou-nos para recordação futura. O Alberto, eu, o Zé e o Romualdo. Grandes companheiros e grandes conhecedores de Crestuma.
 A Dona Rosinha, cozinheira de mão cheia.
Vamos arrancar para nova etapa, não sem antes registar mais uma panorâmica sobre a enorme vastidão que a foto não consegue alcançar. Já há sol aberto, embora com algumas nuvens dispersas, que dão um toque de elegância à foto.

Homenagem ao Poeta Crestumense Eugénio Paiva Freixo autor da letra do Hino do Clube Náutico

Pormenores crestumenses durante a "caminhada".
Antigas fábricas desactivadas. Em grande plano a Fiação A. C. da Cunha Morais

Foz do Rio Uima no Douro, que nasce nas Terras da Feira. Juntamente com a palavra Crastum, que terá existido no Castelo, deu inicialmente Crastuima que foi derivando etimologicamente até chegar a Crestuma.
Crestuma foi couto do Bispo do Porto D. Hugo, doado pela Rainha D. Teresa - princípios do séc. XII - e confirmado pelo filho D. Afonso Henriques, o nosso primeiro, ao sucessor Pedro Rabaldis.
O primeiro documento escrito sobre Crestuma é de 922 e refere uma ermida como seu cemitério, no mosteiro e na vila.
Mas caminhando passamos pela casa do comendador Pimenta da Fonseca. Hoje está tudo em ruínas e alguns terrenos abandonados. Embora hajam alguns edifícios em recuperação e outros espaços com oficinas instaladas nas antigas instalações. Quanto à fábrica de fiação que fundou lá iremos.

Mas por agora vamos visitar exteriormente a Companhia de Fiação de Crestuma e contar um pouco da sua história. Mas segundo li em http://gaiserv.com.sapo.pt/livro_cale/pagina3.htm estes terrenos pertenciam na altura a Lever. Crestumenses e Leverenses passavam a vida aos tiros e às bombas entre si pela delimitação das terras. Ainda não vão muitos anos e os portugueses devem-se lembrar da guerra entre Lever e Crestuma por causa da barragem. Que meteu pelo meio boicote de eleições aquando da candidatura de Mário Soares. 
Tudo sanado hoje em dia até porque fazem parte da mesma associação de freguesias que os nossos inteligentes governantes de Lisboa assim decidiram.
Adiante.
Na margem direita do Rio Uíma, no morro encontramos dois canhões miguelistas (recordo aos meus queridos amigos e leitores a Guerra Civil nos anos 20/30 do séc. XIX entre os manos D. Pedro I e D. Miguel, bastas vezes referenciada nos meus pobres escritos) que ninguém sabe de onde vieram. Presume-se que ultimamente serviam de decoração da alameda que levava à Fábrica por este lado.
Os meus amigos e cicerones gentilmente retiraram as silvas que os cobriam para poder registar mais em pormenor o brasão de D. Miguel e a data da construção. Presume-se.
Voltemos à história do edifício e como chegou à Companhia de Fiação de Crestuma. Inicialmente eram as instalações de um moinho para produção de energia hidráulica. A Real Companhia Velha também conhecida por Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro, no séc. XVIII aproveitou as instalações para adaptar uma fundição para produzir os arcos em ferro para as pipas do Vinho do Porto que era orientada por um senhor de nacionalidade russa.
Edifício do Corpo de Bombeiros privativo criado pela Companhia de Crestuma

O Palacete do Pimenta da Fonseca visto do lado da Fábrica.

Continuando a história. Por estes lados haviam muitas fábricas de fundição de ferro e D. Miguel escolheu esta também para o fabrico de armamento. Visitou-a em Dezembro de 1832.
Em 1854, tudo que existia foi adquirido pela Companhia de Fiação de Crestuma.
O pedestal vandalisado onde assentava um busto do Comendador Pimenta da Fonseca que desapareceu.

Mais uma voltinha e fomos parar a Lever para tomar uma loirinha e aprender mais coisas. Uma árvore - ou será arbusto ? - mesmo junto a nós dá-nos o prazer de olhar as suas belas flores.

Homenagem à Tecedeira. Crestuma foi um grande e muito importante centro têxtil. Em fundo uma das unidades fabris extintas.

Vista de um outro lugar a Companhia de Fiação de Crestuma. O dono, Comendador Pimenta da Fonseca, construiu um edifício grandioso onde o azulejo é rei na Rua de Santa Catarina no Porto. Conhecido como Castelo de Santa Catarina é agora uma unidade hoteleira.
Alguns edifícios recuperados ou em fase de recuperação.
Quási a chegar ao Rio Douro, a enorme Fábrica de Fiação de A.C. da Cunha Morais. A história da família Cunha Morais é interessantíssima. E actividades dos seus membros muito rica,  incluindo fotografia, vidas em África e Brasil, maçonaria e republicanismo, bombismo e ligação a grandes intelectuais. A quem interessar pode ser lida em http://dited.bn.pt/29544/578/754.pdf
Uma última caminhada até à Fonte Velha cuja água vai dar a um riacho. E cá está mais um parque de lazer.
Tenho de agradecer aos meus cicerones Zé Ferreira, Alberto e Romualdo. Não é todos os dias que encontramos amigos destes.